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Posts Tagged ‘metrô’

Na perspectiva de Taras Grescoe, o seguro de automóvel seria bem mais caro. Com assinatura de Isabella Ayub, a entrevista com o escritor canadense traz declarações como “você passa nove anos da vida dentro de um carro” e “se as autoridades usassem o dinheiro que é investido em estradas e rodovias para aprimorar o transporte público, teríamos cidades mais saudáveis e funcionando melhor”, como segue, em matéria da Época:
No futuro, os carros não vão caber nas cidades
O escritor canadense Taras Grescoe recusa-se a comprar um carro. Mesmo com um filho recém-nascido, faz suas tarefas diárias a pé, de metrô, de ônibus ou de trem em Montreal, onde vive. Em seu livro Straphanger (expressão que identifica uma pessoa que só anda de transporte público), sem previsão de lançamento no Brasil, Grescoe conta o que viu de mais inovador pelo mundo em cidades-referência em transporte público. E tenta convencer o leitor a viver sem carro.
ÉPOCA – O senhor afirma no seu livro que o automóvel nunca foi uma tecnologia apropriada para as cidades. Por quê?
Taras Grescoe
– Os carros diminuem significativamente a qualidade de vida nas cidades. Elas foram originalmente projetadas para os pedestres. Depois, se expandiram com o uso do bonde movido a cavalos e do bonde elétrico. Ainda assim, a maioria das cidades na América do Norte eram rodeadas por subúrbios onde era possível andar a pé livremente pelas ruas. Após a Segunda Guerra Mundial, as cidades começaram a crescer sob a influência do carro. As cidades existem há sete mil anos. Somente nos último cinquenta anos os carros determinaram a forma urbana. O problema agora é que metade da população mundial vive em cidades e esse número deve crescer para 75% até o meio desse milênio. No futuro, os carros não vão caber nas cidades.
ÉPOCA – Mas o carro foi sempre um vilão? Não ajudou a trazer progresso aos Estados Unidos e outros países do mundo?
Grescoe – Inicialmente, o carro não foi um vilão nos Estados Unidos. Era o símbolo de liberdade e individualidade. Mas ao pensar na história do automóvel na América do Norte, ele foi sim um vilão em diversas cidades. Somente os aristocratas dirigiam carros e eles causavam um número alto de mortes. Nos anos 1920, milhares de crianças morreram atropeladas enquanto os motoristas ricos dirigiam pelas ruas. Isso gerou diversos protestos na época. Nos Estados Unidos, particularmente, o carro sempre foi associado a grandes rodovias, à noção de independência, Pé na estrada, de Kerouac… Mas hoje as coisas mudaram. Detroit, o centro do automóvel, está praticamente arruinada. Perdeu pelo menos metade de sua população nos últimos anos. Há uma verdadeira mudança acontecendo. Agora, os jovens veem o carro como símbolo de isolamento social. Uma pesquisia com a geração Y mostrou que pelo menos metade dos jovens americanos preferem ter um smartphone ou acesso à internet a comprar um carro.
ÉPOCA – O que motivou essa mudança?
Grescoe –
Muitos desses jovens foram criados em subúrbios e contaram com seus pais os levando para todo o canto de carro. Quando chegaram aos seus 20, 30 anos, se mudaram para as cidades. Os jovens estão mais interessados em viver em um lugares onde seja possível andar a pé, dispensando o uso do carro. Os millenials têm menos medo de andar pelas cidades e utilizar o transporte público. A qualidade e a segurança melhoraram também. Eles não saíram das cidades como seus pais. Estão voltando para elas. Há também, desde 2008, a recessão. Carros são caros e o trânsito nas cidades só piora. É preciso fazer alguma coisa quando se dá conta que você passa nove anos da vida dentro de um carro.
 
ÉPOCA – Críticos do automóvel, como o senhor, recorrem a argumentos racionais. Como convencer pessoas a não comprar mais carros quando a escolha delas é guiada por fatores subjetivos, como status e o sentimento de segurança?
Grescoe –
Isso é um desafio para regiões como a América Latina. Em cidades como São Paulo, ter um carro é em parte uma questão de classe. As elites não se sentem seguras no transporte público e compram carros. Bogotá, nos anos 1990, era uma das cidades mais perigosas do mundo. Mas eles melhoraram o espaço e o transporte público, e, de certa forma, passaram a demonizar o carro. Eles disseram “por que somente 20% dos bogotanos deveriam ficar com todo o espaço público?”. É preciso fazer com que as pessoas mudem a relação que elas têm com a rua. Vivemos em uma democracia e é importante mostrar que as ruas não são só para as elites. Elas são para os 80% da população que não têm carros. No Brasil, Curitiba fez a coisa certa. Quando você precisa se colocar atrás de uma estrutura de metal e vidro para se sentir seguro, é sinal de que algo vai mal na sociedade. Entendo porque as pessoas usam carro, mas não é uma boa escolha para a sociedade.
ÉPOCA – No Brasil, as classes médias altas se recusam a usar transporte público. A atitude do Estado deve ser melhorar o transporte para atrair mais público ou atrair o público primeiro, gerar mais receita, e então aprimorá-lo?
Grescoe –
Você não pode simplesmente tentar atrair as pessoas se não melhorar o sistema. Isso aconteceu em Nova York, por exemplo. Nos anos 1990, o metrô era todo pichado, sujo, e tinha muitos problemas de segurança. As pessoas tinham medo de entrar no metrô. A primeira coisa a ser feita foi limpar diariamente os vagões. Depois puseram mais policiais e câmeras nas estações. As pessoas precisam se sentir mais seguras primeiro. E isso por ser feito com medidas simples.
ÉPOCA – O senhor cita o sistema de metrô de Paris como um dos mais eficientes do mundo. Mas ele foi inaugurado em 1900, quando as circunstâncias e os custos eram outros. Seria possível replicar um modelo como o de Paris nas cidades de hoje?
Grescoe –
Sim. Xangai, por exemplo, construiu o maior sistema de metrô do mundo em apenas 10 anos. Se as autoridades usassem o dinheiro que é investido em estradas e rodovias para aprimorar o transporte público, teríamos cidades mais saudáveis e funcionando melhor. Fazendo isso, qualquer lugar poderia ter um melhor sistema de transporte.

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Quem foi que disse que andar de carro é mais seguro? E, se é tão seguro no conceito da população, por que o seguro de automóvel é ainda o mais conhecido e consumido no país? Alguns responderão que a população está preocupada com roubos e furtos e não com acidentes de trânsito. Será?

A gente prefere pegar carona em ideias de especialistas e por isso o Consumidor Seguro reproduz o artigo “Percepções distorcidas e a realidade no trânsito”, de Daniel Santini, publicado no site Outras Vias:

 

Foto do Espaço Kids da Fundação Volkswagen, uma das atrações para crianças no Salão do Automóvel. Entre as atrações para a “garotada” no evento está um simulador da Citröen para tirar rachas a até 340 km/h (clique na imagem para mais informações)

“É preciso procurar discernir o que é desejo e o que é necessidade. Há uma poluição de informações que recebemos diariamente. Temos mais de duas mil publicidades por dia que chegam no nosso cérebro incentivando a consumir. São cartazes, placas, anúncios, revistas. É um apelo muito forte”, Diogenes Donizete, técnico da Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon-SP), em entrevista sobre compras de Natal em dezembro de 2010.

A publicidade utiliza estratégias sofisticadas de psicologia para transmitir ideias, criar sensações e convencer. Em setores econômicos que movimentam milhões e dependem de altos índices de consumo, as empresas atuam isoladamente ou em conjunto para manter as vendas em alta, muitas vezes sublimando e até distorcendo a realidade, ou adaptando e criando novos valores culturais e sociais.

Leia o artigo da psicóloga Maria Rita Kehl sobre fetichismo e perversões no blog da Boitempo

A desinformação se completa pela preguiça, má vontade ou cinismo de boa parte da imprensa, que reproduz releases de maneira passiva e repete estereótipos e lugares comuns sem reflexão. É por isso que a quantidade absurda de acidentes de trânsito que acontece a cada feriado, com número de mortes equivalente à queda de um avião de grande porte, não ganha o destaque necessário. É por isso que adotamos sistemas estúpidos em que há desperdício de energia e recursos, além do comprometimento de milhares de vidas. É por falta de informação técnica de qualidade, jornalismo e discussão que o transporte de carga é prioritariamente rodoviário e não ferroviário no Brasil, só para citar um exemplo do que poderia ser mudado.

Percepções reais
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou nesta semana a segunda parte do estudo (PDF no GoogleDocs) feito sobre Mobilidade Urbana, parte da série de pesquisas para a construção de um Sistema de Indicadores de Percepção Social sobre diversos temas. A intenção do trabalho é quantificar e avaliar as percepções da população, de modo a ajudar na construção de políticas públicas e na resolução dos problemas que afetam a vida das pessoas. É um mecanismo democrático de ampliar a possibilidade de participação coletiva e melhor embasar decisões administrativas.

Na primeira parte do estudo os técnicos apontaram que, apesar de os investimentos públicos serem concentrados na ampliação e melhoria da infraestrutura necessária para o transporte motorizado individual, tais como gastos milionários em obras para construção de pontes e túneis e alargamento de avenidas, a maioria da população usa transporte público, bicicletas ou caminha. Desta vez, o destaque foi para a sensação (ao que tudo indica) exagerada de segurança de quem dirige.

 

Motoristas e passageiros de carro sentem-se mais seguros do que os passageiros de transporte público em relação a acidentes e assaltos sempre, mesmo quando já tiveram experiências negativas. Entre os que já sofreram acidentes em carros, 78% sempre ou na maioria das vezes se sente seguro. Entre os que já sofreram acidentes em ônibus, este índice cai para 40%. Entre os que já sofreram assaltos em carros, 81% sempre ou na maioria das vezes se sentem seguros. Entre os passageiros de ônibus assaltados, o índice de novo despenca: 38%.

Andar de carro é mesmo tão mais seguro assim? O senso-comum se confirma? Será que temos outros fatores influenciando na construção do imaginário coletivo de que carros são mais seguros? O Ipea conclui o estudo defendendo que é preciso questionar e investigar mais a questão, reunindo dados técnicos e objetivos e ampliando o acesso à informação.

“A população precisa ser esclarecida quanto às características de cada modo de transporte em suas respectivas cidades. Além de ter direito a escolha do meio de transporte que quiser utilizar, a população tem que ter acesso à informação para poder realizar esta escolha dentro dos critérios que considerar mais relevante. Quais as vantagens e desvantagens de cada modo? Qual deles é o mais rápido para o trajeto e destino desejado? Qual é o mais barato (incluindo todos os gastos a eles vinculados? Quem paga por estes gastos? Será que o serviço está mesmo indisponível ou não se tem acesso à informação sobre ele? Apesar da sensação de segurança constatada pelo usuário do transporte individual, utilizar o automóvel é de fato mais seguro?”, que foi trecho da conclusão do estudo do Ipea.

Pressa e transporte coletivo
Além de questionar a sensação de segurança no trânsito, a pesquisa do Ipea trás também informações interessantes para qualquer um que tenha interesse em discutir ou pensar sobre sistemas coletivos de mobilidade pública. Um dos elementos a ser considerado é que a pressa é um dos fatores decisivos na escolha do modal.

 

Velocidade é necessidade básica para todo mundo. Há também outros pontos a serem considerados:

“Os motivos mais indicados pelos pedestres para terem optado por andar a pé são a saúde e a rapidez. Eles afirmam predominantemente que passariam a usar o Transporte Público se ele estivesse disponível, fosse mais barato e também mais rápido; estas duas últimas características para o pedestre são necessárias para se ter um bom transporte. As outras pessoas que se utilizam do transporte não-motorizado (os ciclistas) escolhem a bicicleta pelos mesmos motivos que o pedestre opta por andar a pé (saúde e rapidez), mas também ressaltam o motivo do baixo custo. Assim como para os pedestres, a saúde deixa de ser observada como principal condição para os ciclistas migrarem para o Transporte Público, sendo substituída pela disponibilidade. Além do preço e rapidez, eles ressaltam o conforto (um pouco mais do que os pedestres destacam) como sendo característica de um bom transporte. O conforto é captado como uma das principais condições de migração modal apenas nos usuários de carro, mas aparece como característica de bom transporte para ambos, junto com a rapidez e o conforto”, trecho da pesquisa do Ipea.

Transporte público
Outro ponto a ser considerado é que a ideia de que transporte público é sempre lento ineficiente nem sempre se justifica. O Ipea defende a construção de novos indicadores e a divulgação ampla de informações objetivas para ajudar a corrigir distorções na percepção sobre o tema:

“Ainda que predomine em todos os outros respondentes a indicação de maior rapidez como uma das condições necessárias para que passem a usar o Transporte Público, os usuários do Transporte Público indicam a rapidez como uma das características que os fizeram usar esse meio de transporte. Nota-se, portanto, que a percepção sobre o Transporte Público por aqueles que não são usuários pode ser bastante distinta ou mesmo oposta daque les que o utilizam. Essa é uma constatação fundamental para a atuação pública e necessita dos devidos aprofundamentos para esclarecer a população, sem deixar de manter os esforços na constante melhoria do sistema de transporte público. Nesse sentido estudos que demonstrem velocidades médias urbanas por meio de transporte serviriam para corrigir ou ratificar a impressão que as pessoas têm sobre a rapidez e a eficiência do uso do automóvel em detrimento do Transporte Público, por exemplo.”

 

Soluções
Por fim, como não poderia deixar de ser, o instituto recomenda investimento em sistemas de transporte coletivo e redução de tarifas como solução para mobilidade urbana:

Percebeu-se uma preocupação geral com a rapidez, o preço e disponibilidade do transporte. Todas elas tendem a justificar investimentos em corredores de ônibus e metrôs aliados a políticas tarifárias que permitam ampliar o número de usuários de TP num cenário em que se reduz o tempo de viagem ao mesmo tempo em que são incluídas mais pessoas no sistema.

 P.S. – Dessa vez, quem encaminhou o estudo foi o Gustavo Faleiros, editor do portal ((o)) eco e o Ardilhes Moreira, amigos atentos. A ideia de destacar a diferença entre percepção e realidade veio de uma discussão sobre poluição e saúde no Twitter. Quem você acha que sofre mais com os efeitos da fumaça? Quem dirige ou pedala? Vale conferir os links neste texto sobre o assunto do blog Vádebike.org para pensar a questão.

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